terça-feira, 28 de julho de 2020

MINHA ÁRVORE PRODUZ MAIS FOLHAS DO QUE FRUTOS


Consciência Livre

Caso um corpo celeste caísse no centro do Museu do Louvre e com isso uma cratera imensa se abrisse engolindo o mesmo com toda sua produção histórica de uma vez por todas... O que efetivamente mudaria em sua existência?
Provável e certamente, nada.
Provavelmente também alguns nem sabem o que seja o Museu do Louvre, onde fica e a que se presta, outros menos atentos, talvez não saibam sequer o que seja “corpo celeste”.
O que se fez na história da humanidade e a forma como damos valor a isso, seja a um quadro, escultura, música, dança, morre no decorrer de alguns parcos anos. Tivemos muitos incêndios em acervos históricos, fossem esses de causas naturais ou causados pela repulsa humana, a exemplo da Biblioteca de Alexandria e de todas as imagens antiquíssimas que foram “assassinadas” à tiros no Oriente Médio. Quem se lembra disso, ou quem precisou delas para viver até agora?
Consciência Livre
Afinal, de que estamos falando aqui? De valores. De importâncias que damos a isso ou aquilo, a ponto de chegarmos a dar um preço ou ficarmos presos, lutar por, ou petrificadamente temer. Seja a Torre Eiffel, ou a minha capinha de celular nova.
A identidade emocional e a carga de sentimentos que emprestamos a esse conjunto de saberes, conhecimentos morrem a cada geração que se passa no interregno de parcos 50 anos. Meio século é suficiente para sepultar a música que tanto adorávamos e que violava os ouvidos de nossos pais, que por sua vez o fizeram com nossos avós. Cíclico.
Consciência Livre
Defendemos com unhas e dentes que o vinil é melhor que o CD, ao passo que nós mesmos não usamos nem o CD e nem o pen drive. Acessamos nossas “melhores” músicas pelo ar, através das “malditas” ondas eletromagnéticas. E sequer temos senso musical para diferenciar esse tom daquele meio tom. Queremos consumir o que nos enleva, o que nos liberta, o que nos prova sermos radicais e revolucionários. Sequer sabemos que as faixas de frequências musicais foram adulteradas no curso da 2ª Grande Guerra Mundial, e, para falar a verdade, o que mudou atomicamente dentro de nós com isso?
Consciência Livre
O vegetariano, o carnívoro, o abstêmio, o alcoólatra, o sedentário, o atleta. No passo de 30 anos – caso não sejam derrotados pelos ataques que a existência lhes impõe – chegaram além da meia idade iguais. Um pouco mais de peso, menos cabelos, rugas que se tenta ocultar com os cremes da moda (eis que os que haviam de suprassumo há 50 anos, não prestam).
O que precisamos ostentar em nossas tribos é o que nossos agrupamentos de afinidades defendem. Defesa essa (ou ostentação) que somente é possível no grupo.
O que a solidão forçada tem provado? Que não tem graça entornar quatro garrafas de cerveja sentados à mesa de nossa cozinha; que o corte de cabelo ou a barba escanhoada não serviu para nada. Que o esmalte carmim reluzente nas unhas ninguém viu. Quantas abdominais eu fiz ou a dieta especial de frutas e jejuns intermitentes. Ou cigarros, ou churrascos... não há por que mostrar ou fazer.
Consciência Livre
Dormir além da hora, cansa.
Comer além do necessário, cansa.
Cozinhar sozinho, exercitar-se, ler, assistir lives, vídeo chamadas, mensagens, filhos, pais, o tão sonhado trabalho em casa. Cansa.
Somos seres construídos para nos sociabilizar. Com a liberdade de não o querer e voltar para um teto dito nosso quando assim bem o quisermos. Desde que maiores e vacinados. Desde que não se tenha um pai ou mãe idosos para cuidar. Desde que não se tenha um marido, uma esposa que nos vigia. Desde que não se tenha que levantar cedo amanhã. Desde que nossa liberdade tão sonhada não chegue!
Sim, temos medo da liberdade. Tememos aquilo que usamos sempre para nos defender e nos justificar de nossas incapacidades, frustrações, recusas, impotências... sonhos. Sermos livres onera com uma responsabilidade pessoal e intransferível de compromisso. Tememos o amor. O carinho. O afeto, a sexualidade, pois isso subtrai de nós a liberdade que temos de não sermos livres.
Consciência Livre
Compromissos geram obrigações, cobranças e isso não nos convém. E assim, melhor não sermos livres para podermos sentar-nos à mesa filosófica do bar e reclamarmos sobre nossa prisão. Melhor nada sabermos, pois na nossa ignorância adestrada pela nossa má vontade em sermos livres e destemidos, continuaremos “protegidos” no fim do dia, sob o telhado de nosso lar.
Agarramo-nos aos ecos de nosso passado, na certeza de que não mudaremos, apesar de implorarmos por mudanças. Que caia um corpo celeste para limpar tudo. Mas torcemos em segredo escondendo nosso temor, para que nossas “preces” não sejam atendidas.
Consciência Livre
Olvidamos “panta rei” – tudo muda – saibamos nós disso ou não. Alguns sequer no leito de morte, corroídos pelo arrependimento, se permitem a liberdade; ainda acossados nas costas pelo açoite invisível de uma exigência auto imposta a qual nos agarramos religiosamente como a nossa ética que dita nossa moral, assim sofrendo, exatamente pelo medo de sofrer. Suplicamos a mudança, brigamos por ela, mas quando ela nos chega ao colo, tornamo-nos ranzinzas pelo simples fato delas terem mudado. E sempre terceirizando responsabilidades (ou martirizados pela vitimização).
Sofremos pelo que não temos e não o teremos, pois tememos por padecida antecipação ilusória, como poderá ser a perda quando o tivermos.
A felicidade não é desfrutada, eis que temos o pavor de não a termos amanhã, por mais que nos corta cirurgicamente o peito a ânsia de querermos ser felizes.
Consciência Livre
O filme “Agora estamos sozinhos” (I Think We're Alone Now) pontua magistralmente até o meio da estória – pois é preciso ter um final – de maneira brutal como a necessidade de estarmos sozinhos é imperiosa, e como, quando assim temos a solidão, precisamos criar rotinas metódicas para sobrevivermos ao dia que se seguirá. Assim, quando essa solidão é quebrada, percebemos revoltados que queremos voltar a termos solitude, mas, quando essa ameaçadoramente se mostra plausível, desesperadamente queremos alguém. Alguém para brigar, ou nos ouvir, alguém para quebrar a rotina, alguém para dividir nosso pensar, alguém para abraçar, beijar e fazer amor e permitir que sinta o quanto podemos amar e o quanto queremos ser amados. Simples assim.
Consciência Livre
Somos capazes de nos adaptar, mas nos moldar ao ambiente, ao meio, nos condena à extinção. Temos aptidão de irmos além da borda. Se um rio parasse, seria um lago.
Não preciso deixar um legado para ser guardado no Louvre. Preciso viver minha existência agora. Seja sentado, deitado, andando, quieto ou agitado. Impera que tenha consciência de minha escolha para não me arrepender com medo em meu leito de morte de não ter olhado, tocado, sentido, chorado, lutado, amado. Apalpando os cabelos brancos e constatando sozinho o quanto são secos.
Quem se importa se houve esforço ou atenção ao produzir o que aqui se está escrito, atenção à nova gramática, às vírgulas, acentuações, normas contemporâneas, se quase ninguém lerá, e muitos, creiam ou não, sequer sabem ler.
Consciência Livre


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